Hollywood na Broadway - quase lá!

Numa recente visita a Nova York, quase cometi a insanidade de não ir à Broadway (confesso que só considerar a possibilidade de não ir já é por si só uma insanidade). A questão é que tinha montado um roteiro alternativo pela cidade, no qual a Broadway era uma possibilidade conforme o tempo disponível. Isso mesmo, se desse tempo...!
Era sexta-feira, 11 de setembro, por volta de 17h. Eu procurava o último item do roteiro daquele dia. Tratava-se do Discovery Times Square Exposition, um recém-inaugurado espaço que trazia duas interessantíssimas exposições: Titanic e o Legado de Lucy. Fica na Rua 44, a duas quadras da 42 St., região de Times Square e da... Broadway.
Andava pela rua procurando o Discovery quando, de repente, olhei à esquerda e vi o Teatro Majestic, onde “O Fantasma da Ópera” estava em cartaz. Fiquei exultante - sempre quis ver essa peça e ela estava ali, perto de mim. Alguns passos à frente me deparei com o museu. “Bom”, pensei, “são cerca de 17h30. Se tudo der certo, saio a tempo de ver a peça. Se não der, tudo bem”. A prioridade era o museu.
Não que as duas exposições não tenham valido a pena - valeram demais! Deparar-me com Lucy, o ancestral humano mais antigo já conhecido, com 3,18 milhões de anos, foi emocionante (mas isso conto em outra oportunidade).



Vi as duas exposições com toda a tranquilidade, a ponto de ficar muitos minutos olhando para aquele esqueleto de milhões de anos. Quando saí do museu, vi as filas nas portas dos teatros. Esbocei um sorriso - se tivesse sorte, daria tempo de ver a peça. Foi quando olhei para frente e vi um letreiro enorme anunciando “Hamlet”! Havia lido a obra tempos antes e vê-la na Broadway me atiçou. Ainda no letreiro, vi: “With Jude Law”. Nossa, estava à minha frente a oportunidade de ver uma peça na Broadway com um astro de Hollywood. O letreiro ainda informava que o ator ficaria lá em curta temporada, até 8 de dezembro. Sem dúvida, seria um privilégio.
Não tive dúvida: cruzei a rua e fui direto à bilheteria. Não tive tempo nem de estranhar a ausência de filas (na verdade, havia tantas filas na rua que sequer reparei que naquele teatro elas não existiam). Achei que todos já tivessem entrado e fiz a pergunta a partir dessa lógica: “Ainda há ingressos?”. A resposta foi um balde de água fria. “A estreia será amanhã apenas”. Foi aí que me dei conta de tudo. Ainda olhei para um cartaz à minha direita anunciando a estreia grandiosa no sábado.
Não tive como não lamentar, afinal deixaria a cidade na manhã seguinte. Ao mesmo tempo, quase não tive tempo de lamentar. Eram 19h50 e mal teria tempo de tentar um ingresso de “O Fantasma da Ópera”. No Majestic, as filas entrando, a bilheteria ainda aberta. Repeti a pergunta: “Ainda há ingressos?”. A resposta, sorridente, veio seguida de uma oferta: “Sim, temos um lugar ótimo”. Quinta fila, em frente à orquestra. Preço: US$ 120.
Em dez minutos, começava a assistir mais um espetáculo inesquecível... na Broadway!



PS: o “Jornal da Globo” apresentou quinta-feira (26/11/09) uma interessante reportagem sobre a invasão hollywoodiana à Broadway. Estão lá em cartaz Hugh Jackman, Daniel Craig e Sienna Miller, além de Jude Law. Veja a reportagem abaixo.





A foto da peça foi capturada no site oficial. Para acessar, clique aqui.

Vidas além do muro

A Alemanha é fascinante – já escrevi a respeito neste blog. Do ponto de vista econômico, chega a ser uma fênix. Afinal, em pouco mais de 40 anos, ressurgiu duas vezes. Em 1945, com a derrota na Segunda Guerra Mundial, a Alemanha era terra arrasada - literalmente. As cidades estavam destroçadas e a economia em frangalhos. Era preciso recomeçar.
Foi um duro recomeço, confidenciou um amigo de Odenthal, cidadezinha aconchegante entre as montanhas, perto de Colônia. O pão era a base – muitas vezes solitária – da alimentação. O governo decidira criar uma nova moeda. Surgia o marco alemão. Cada cidadão recebeu 40 marcos, disse meu amigo. “Desde então, nunca ganhei em um ano menos do que ganhara no ano anterior”, falou. Em tempo: ele é engenheiro agrônomo aposentado.
Não é tarefa para qualquer um renascer desta forma e ingressar num trilho de desenvolvimento a ponto de se colocar em poucos anos como a maior economia do continente – e estamos falando da Europa!
Mas a Segunda Guerra deixou também sequelas profundas, que literalmente dividiram o país. A parte oriental ficou sob domínio soviético, formando uma nova nação. Na então capital, um muro escancarou essa fratura. Durante quatro décadas, o Muro de Berlim foi o símbolo de um mundo dividido entre capitalistas e socialistas; foi o símbolo de uma sociedade ferida, marcada pela intolerância e – por que não dizer? – pela ignorância. Foi o símbolo de uma época de medo.
Há exatos 20 anos, porém, o Muro de Berlim caiu. Derrubado pelo povo. A Alemanha voltava a ser uma só nação. Mais uma vez, o país se viu diante da necessidade de recomeçar. Mais uma vez, a economia era ponto chave. Durante os tempos de Guerra Fria, a porção ocidental desenvolveu-se a ponto da Alemanha tornar-se uma das maiores economias do mundo. Não se pode dizer o mesmo da porção oriental. A reunificação representou aos alemães um enorme desafio.
Desde que o muro caiu, o governo decidiu subsidiar – por meio de pesados investimentos – o desenvolvimento da parte oriental do país. Era preciso, entre outras tarefas, promover a equiparação salarial e a recuperação da infraestrutura. Afinal, os 40 anos de divisão criaram um enorme abismo. Basta dizer que os carrões alemães, tão comuns de um lado da nação, eram raros do outro. Ainda hoje, vários estados da porção ocidental bancam o desenvolvimento da parte oriental.
Tão importante quanto recuperar a economia, porém, era mudar a cultura, já que toda uma geração havia sido criada sob preceitos socialistas. Numa visita à porção oriental do país em 2005, vi situações e ouvi relatos que mostram como esse momento crucial da história do século 20 se refletiu na vida dos cidadãos. Em Rudolstadt, o acaso me colocou de frente com uma jovem senhora. Chamada Helen (à direita na foto), ela disse ser escritora. Estava no alto de um penhasco, no jardim de um antigo castelo. Falava inglês e ofereceu ajuda; em troca, ganhou uma carona.

Durante o percurso do penhasco até o hotel que indicara, Helen falou com um ar saudosista dos tempos de Alemanha Oriental. “Antes havia empregos, hoje a indústria está quebrada”, disse. A cidade fora um importante centro têxtil, que não resistiu às recém-surgidas práticas capitalistas. Todo o setor faliu – e era possível ver as velhas indústrias abandonadas.
Para Helen, a vida era melhor antes. Ela não só falava de empregos, mas do modo de vida, do modo de pensar daquela sociedade que se viu “invadida” por um novo modelo, individualista e competitivo.
Confesso que as manifestações da escritora me surpreenderam. Imaginava que me depararia com um confronto simples entre o “atrasado” mundo socialista e o “desenvolvido” mundo capitalista. Aprendi, porém, que a história não é tão simples assim. Aprendi que quem faz a história somos nós.
Se Helen tinha razão, não sei. Ela tinha as razões dela indiscutivelmente. Com sua meia idade, era o exemplo acabado da geração que nascera e crescera naquele mundo dividido. Imaginar a Alemanha como um só país era para ela e para muitos uma novidade. Era lidar com o desconhecido.O fato é que o Muro de Berlim tornara-se inadequado para aquele novo mundo que nascia ao final do século 20. Infelizmente, o século 21 chegou e muitos outros muros seguem erguidos mundo afora. Muros reais – como os que dividem EUA e México, judeus e palestinos - e muros invisíveis, como o da intolerância. Sim, há muitos muros a derrubar. Hoje, porém, é dia de brindar. No dia 9 de novembro de 1989, um muro caiu. Em Berlim.

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