"My sunshine"


Não foi o acaso que deu à Flórida a alcunha de “sunshine state”, o Estado dos raios do sol. Há quem vá dizer que o sol nasceu pra todos, o que é fato. Mas o sol daqui não é igual ao de acolá. Senão vejamos: o sol da Flórida brilha mais porque seus raios encontram no caminho as águas claras do Caribe, as folhas esverdeadas das palmeiras, a alma e o ritmo quentes tipicamente latinos. Sim, tudo parte do mesmo sol, mas o resultado que temos dele, aquilo a que convencionamos chamar de sol (seu calor, sua cor), manifesta-se de formas diferenciadas em várias partes do planeta.
No frio território norte-americano, a Flórida é um paraíso. Um ponto tropical em meio a uma imensidão temperada. Não é à toa que o estado mais ao sul da Costa Leste dos Estados Unidos é o destino favorito durante as chamadas férias de verão. Turistas de todos os cantos do país deslocam-se para lá a fim de curtir as belezas naturais daquele litoral. É a versão de lazer do famoso sonho americano. E não só americano. Desde que Walt Disney plantou ali o seu mundo encantado, milhões de turistas de todas as partes do planeta dirigem-se até a Flórida para se divertir nos parques do Mickey – e em outros que foram atraídos pelos bilhões de dólares deixados lá todos os anos.
Mas se o sol não é o mesmo em todos os lugares, também não é o mesmo em todos os momentos. Ver o sol nascer em pleno “sunshine state”, por exemplo, é uma ocasião especial. Foi justamente esta visão que se apresentou durante uma longa – e um tanto cansativa – viagem de ônibus rumo a Miami desde Atlanta, no estado da Georgia. A chegada na Flórida coincidiu com o raiar do dia. Pela janela, observei uma bola dourada reluzindo ainda tímida no horizonte. O tom adquiria uma força extrema ao se contrapor à escuridão do fim da madrugada e ao marrom do vidro do ônibus.


Aos poucos, o dourado foi assumindo uma tonalidade mais amarelada, rumando à cor tradicional de gema de ovo dos raios solares. Era o dia se apresentando em todo o seu esplendor.
E assim seguiu até o entardecer, quando o horizonte ganhou tons alaranjados e roseados, o espetáculo crepuscular resultante dos reflexos do sol nas nuvens. Um espetáculo que, por si só, já é merecedor de contemplação ganha na Flórida um significado mais abrangente. Afinal, é o momento em que o personagem mais importante do estado diz adeus rumo ao seu descanso noturno. Talvez por isso este acontecimento pareça apocalíptico, bondosamente apocalíptico.


No “sunshine state”, tudo é diferente do resto dos EUA. Sequóias, carvalhos e castanheiras dão lugar a palmeiras; pântanos ocupam os espaços de pradarias e estepes; o mar esverdeado surge para escantear o tom cinzento do resto da costa. Na Flórida, a chuva alivia – enquanto nos demais estados ela aluvia. Lá, até os esquilos parecem mais alegres e divertidos.
Ornamentadas pela luz do sol, as palmeiras se parecem com as bailarinas principais de uma renomada companhia de dança, são as peças principais do cenário de um filme de sucesso, a dama a ser cortejada num baile de gala. Não, na Flórida as palmeiras não são simplesmente uma espécie vegetal; são “a” espécie dominante, dominadora na paisagem. Tocadas pelos raios solares, transformam-se em ouro – eis o poder de Midas manifestando-se por meio do astro-rei.


Com presença tão marcante como a do sol, ninguém poderá se sentir sozinho na Flórida. Ele é companhia constante, ainda quando ausente. Acredite, é impossível ignorá-lo. É inevitável senti-lo (na pele, nos olhos, na alma). É necessário admirá-lo. É um dever reverenciá-lo. Afinal, no estado que traz nas placas de seus veículos uma referência ao sol, ninguém poderá deixar de notar sua presença às vezes sufocante, outras ofuscante, mas sempre brilhante. Em todos os sentidos.

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